Entrevistamos o especialista em câmeras termográficas Macson Guedes, Diretor Geral e de Vendas da FLIR Systems na América Latina - NetSeg

Entrevistamos o especialista em câmeras termográficas Macson Guedes, Diretor Geral e de Vendas da FLIR Systems na América Latina

Tecnologia | 2020-05-28

Conheçam Macson Guedes, com experiência de 25 anos de carreira dedicados 100% em temperatura, parte de controle, medição e registro, tudo que você imaginar em termos de medição de temperatura ele trabalhou e durante esse período, basicamente, nos últimos 20 anos trabalhando em temperatura sem contato, o que tem uma relação direta com o tema desta entrevista.

Existem vários detalhes, uma vez que nos últimos 14 ou 15 anos, Guedes trabalhou com equipamentos usados para medição de temperatura, ligado a uma associação de termologia médica no Brasil, juntamente com os PhDs dessa área. Isso significa que ele passou por todas essas outras epidemias, dentro da empresa, desde 2002 com a SARS, Ebola e H1N1. Com toda essa bagagem, tanto na área técnica quanto em coparticipação com a área médica, Guedes desenvolveu bastante coisas para serem ágeis e anteder a população global de maneira mais rápida.

NS: Qual foi o principal objetivo na criação de uma câmera termográfica desenvolvida, principalmente, para as áreas industriais e consequentemente, para a indústria da segurança?

MG: Interessante a pergunta, pois eu tenho uma imagem da década de 60, de um rei sueco testando uma câmera termográfica nossa. Uma das primeiras câmeras termográficas desenvolvidas pela FLIR, na década de 50/60, era uma tecnologia extremamente nova e estritamente militar.

Então como o rádio, o telefone, o sistema de comunicação, e muitas outras coisas surgiram da área militar. E com nossas câmeras não foi diferente. Algo que nasceu na área comercial ao longo dos anos vem cada vez mais ganhando aplicações civis.

Então é interessante porque as pessoas têm a visão de que é um equipamento que custa caro e, na verdade, a gente vem simplificando o equipamento para tornar eles mais baratos e atingir mais e mais aplicações.

Isso é bem interessante e por conta dessa simplificação, as câmeras de segurança se tornaram mais simples. Isto porque elas não têm medição de temperatura e o objetivo delas é enxergar no escuro, é ter uma visão mais longa. Então, quando falamos de uma câmera dessas, o cumprimento da largura de foco é longo porque eu quero ver nítido, desde uma distância média até uma distância longa.

E quando eu falo de uma medição de temperatura, é o contrário, pois eu preciso de um foco bem curto para ter uma precisão de foco naquele ponto e medir corretamente. Apesar de ser a mesma tecnologia, elas caminham para lados opostos. Uma onde eu preciso de precisão de temperatura, outra em que eu preciso de uma visão mais extensa. Eu não posso ter as duas funções na mesma câmera.

O que em acontecido é que hoje, qualquer engenheiro recém formado pode pegar uma câmera de segurança e transformá-la em uma câmera de medição de temperatura, mas para ela ser uma câmera de temperatura e conseguir homogeneidade, estabilidade e ter capacidade de fazer medição em humanos, por exemplo, foram anos de teoria e tecnologia para que isso ocorra.

O que nós estamos vendo agora é muito grave e muitas empresas, principalmente chinesas, estão pegando câmera de segurança e transformando em câmeras “teoricamente” de medição de temperatura humana sem a menor expertise no assunto. Existem normas e conceitos para isso.  Não é técnica. Não estamos falando somente de termografia ou somente da câmera infravermelha. Existe uma fisiologia humana.

O corpo tem a maneira de se expressar, existe medicina por trás disso. Existe a termorregulação do corpo, e uma série de outras coisas que são tão importantes quanto a precisão da câmera por exemplo.

Na hora de apontar a câmera para um ser humano a grande maioria das câmeras do mercado vão medir 36 graus. E estou falando de FLIR para FLIR, por exemplo.

A questão é que existem algoritmos específicos para fazer uma medição de temperatura elevada corporal. Se não usar esses algoritmos, tanto uma pessoa com febre, como uma pessoa sem febre, vai medir 36 graus, mesmo que ela esteja com 39 graus.

No caso de uma câmera com algoritmo ela vai medir os 39 graus. Se eu não tenho algoritmo e aponto para a pessoa, com uma câmera precisa, meio grau, ela vai medir sempre 36 graus e isso é bastante sério. A simplificação traz vantagens e problemas.

Por exemplo, em de aplicação nossa, as empresas de energia, elas compram câmeras para fazer inspeção, nas linhas de transmissão e redes de distribuição. Temos câmeras especificas pra isso, que fazem medição, por exemplo, a 40 metros de distância em uma conexão elétrica de 1 centímetro. Agora, se eu uso um equipamento mais simples e tento fazer essa mesma medição, para se ter uma ideia, a temperatura chega a medir negativa porque a medição não é correta.

Só que na temperatura de um ser humano, esse negativo não acontece, mas você vai medir 36 graus sempre, em qualquer pessoa que passar na frente da câmera. Aí você está fingindo que tem uma câmera de temperatura elevada e nunca vai detectar uma pessoa com febre. Ou seja, você está possivelmente permitindo o acesso de pessoas com corona vírus dentro da sua empresa, dentro do país, dentro da cidade achando que está fazendo uma triagem e não está.

Essa simplificação é positiva na história da FLIR, e hoje temos uma câmera, por exemplo, que eu coloco no celular e transformo o ele em uma câmera termográfica, por 300 dólares. Só que tem gente publicando na internet, esse nosso produto, para medir temperatura elevada nas pessoas. Está errado e não serve para isso.

Então, nosso trabalho nesse momento é o de difundir o que é verdade. Eu cheguei a cancelar um pedido de 2,2 mil câmeras porque não eram ideais para fazer esse tipo de medição. Nós não aceitamos milhões em ordens porque nós não somos movidos por dinheiro. Uma das missões da empresa é salvar vidas e eu não posso ir contra isso. Vender um equipamento que ao invés de salvar, pode prejudicar as pessoas, não tem nosso perfil.

NS: Principalmente em um momento como esse.

MG: Claro. É um momento sério, onde o lado cidadão tem que falar mais alto que o lado comercial. Infelizmente não são todas as empresas que pensam assim.

Para nós esses milhões de dólares que cancelamos faz uma diferença grande enorme, mas ao contrário disso, que quem está do outro lado, e estou falando de órgãos do governo e grandes empresas insistiram muito para que a gente vendesse.

O objetivo deles era colocar algo para “inglês ver”, mas do nosso lado não vamos fazer isso. Obviamente se nós não vendemos, alguém vendeu. E sinto muito pela população desses países ou os empregados dessas empresas que estão sendo submetidos a uma triagem falsa.

NS: Quando foi desenvolvido o primeiro algoritmo para um equipamento de medição de temperatura do corpo humano?

MG: Nós temos equipamentos de centenas de milhares de dólares específicos para área cientifica, que chamamos de Life Science, mas nós precisávamos de algo popular que pudesse ajudar a salvar as pessoas, principalmente na época da SARS que pegou todo mundo de surpresa.

Se parar para pensar, antes de 2002, qual foi a última pandemia/epidemia que nós tivemos? Então passamos um longo período sem nada parecido e, de repente, em 2002/2003, com os governos despreparados, tivemos essa surpresa. Foi nesse momento, que se preparou o primeiro sistema e, de lá para cá, temos melhorado muito. Então, surgiram normas, as ISO, as IES que regem exatamente como deve ser medido, qual a tecnologia que funciona, que a medição tem que ser feita no canal lacrimal, que a pessoa tem que tirar os óculos para fazer a medição, tudo isso consta da norma. Não é a FLIR falando dessa limitação.

Foram normas criadas com base em pesquisas, projetos, em provas sociais, e essas normas deixam claro o que você pode e o que você não pode fazer. Através delas, é que uma empresa como a nossa recebe uma certificação FDA, por exemplo.

Tudo o que a FLIR sugere fazer, não pode medir com óculos, não pode medir com múltiplas pessoas ao mesmo tempo, é o que a concorrência, têm promovido como solução. Tem uma empresa que mostrou a medição de uma pessoa com capacete de motociclista, e isso é um desserviço à sociedade, é contrariar anos de pesquisa, de normatização e aprovação de comitês globais.

Para você entender o algoritmo, tem dois pontos para medir a temperatura no rosto, sendo um dentro do ouvido e o outro é uma artéria carótida que passa bem no cantinho do olho, chamamos essa área de canal lacrimal, que é uma área de 2 a 3 mm.

Imagine medir com uma câmera que tem 0,07 megapixel. Se eu não tiver a uma distância apropriada, eu não tenho pixel suficiente para fazer a medição sequer de uma pessoa, quanto mais colocar dez em uma cena. Existem processos para isso.

Além disso, o algoritmo nosso, tem uma autopercepção das pessoas que passam pela câmera. Daí, as pessoas vão passando e ele vai fazendo a análise de dez pessoas saudáveis que passam pela câmera.  Aqui no brasil estamos em uma estação tropical. Como funcionaria esse processo na Bahia a 40 graus e em Manaus a 40 graus com uma umidade enorme ou no Sul a 10 graus no ambiente. É diferente. O tempo que o corpo demora para estabilizar a temperatura é diferente, o nível do que nós chamaríamos de temperatura elevada é diferente.

O conceito é diferente e nosso equipamento, não importa se está 5 graus na Suécia, ou 42 graus na Bahia, ele faz essa adaptação das pessoas passando pela câmera. Mesmo que eu tenha uma empresa e que de manhã está 18 graus, e tarde está 40 graus, a câmera vai se adaptando a esse processo tratando as pessoas com a temperatura de referência, tornando o algoritmo extremamente importante. Sem ele, a câmera perde a sua funcionalidade. Pensa, o que é alarme para você? Quem define isso? No caso de colocar uma pessoa que está no ar condicionado passando na frente de uma câmera que não faz a medição no local apropriado, vai medir uma temperatura sempre baixa estando ou não com febre.

Então, o algoritmo é muito mais do que buscar o ponto certo de medição, de ter precisão correta, além de tudo isso tem todo um processo que ele vai fazendo uma auto calibração durante o dia.

NS: Esse algoritmo é algo que se aplica a essa linha de câmeras da FLIR que pode ser utilizada para medir a temperatura do corpo humano?

MG: Exato. Uma vantagem que a FLIR tem é que depois que passar o corona vírus é possível desabilitar essa função e usar essas câmeras pra manutenção, segurança e vamos pensar que daqui 2 ou 4 anos se tiver uma  nova pandemia, é só calibrar a câmera e ela está pronta pra ser usada. Não é apenas de uso específico para a corona vírus.

NS: Você começou a falar do estudo em relação ao algoritmo. Como a tecnologia pode ser mais útil na área da saúde em breve.

MG: Já existem muitas coisas. Vamos pensar em uma empresa alimentícia que tem vários controles de acesso para que a pessoa entre limpa, sem levar impurezas para dentro. Já existem alguns protocolos que as pessoas também não devem entrar com enfermidade. Nossas câmeras não detectam vírus, enfermidades nada disso, mas elas servem como uma triagem de temperatura elevada nas pessoas e isso pode, no futuro, ser usado por uma empresa dessas, por exemplo, para eliminar pessoas com enfermidade na linha de produção ou pessoas que fazem trabalhos de risco (trabalho em altura, em máquinas ou confinados).

Mais informações: www.flir.com